domingo, 21 de setembro de 2014

O Regresso.

Depois de ter alargado a Europa até aos Urais, a Europa aborreceu-se de Napoleão e reformou-o. Em 1814, aquele que pôs um exército a ser olhado pela História do cimo da pirâmide, aquele que atravessou o Reno e cruzou estepes, foi metido em Elba, uma ilha de 27 por 18 quilómetros. Aos 45 anos, um albergue de velhinhos. A pequena ilha tinha por símbolo um pavilhão branco com três abelhas. Era muito pouco para uma águia imperial.

Do cimo do monte Capanne podiam ver-se, nos dias claros, a Córsega e, do outro lado, a costa italiana. Duas memórias de começo: o lugar onde nascera e a Itália da sua primeira campanha como general: ambas boas motivações para recomeçar. Tanto mais que o Bourbon que o substituíra nunca lhe tinha enviado um tusto dos prometidos dois milhões de francos de renda. Acrescentem-se as cartas que lhe lia Maria Waleska, a única amante a visitá-lo, onde se garantiam as saudades eternas dos franceses. Menos de um ano depois de a fragata que o trouxe ter deitado ferro na baía de Portoferraio, Napoleão Bonaparte atirou-se de novo à aventura. Deu um baile de Carnaval no Teatro dos Vigilantes, apanhou os espiões ingleses distraídos e embarcou num brigue.

Demorou vinte dias a viagem até Paris. A 1 de Março de 1815, desembarcou no Sul de França. A população acolhia-o num delírio que fazia o contraponto perfeito à indiferença com que o viu partir no ano anterior, depois do Tratado de Fontainebleau. Os notáveis regressavam ao seu manto protector: em Auxerre, até o traídor Marechal Ney veio colocar à disposição a sua espada de "o bravo dos bravos". Na noite de 20 de Março, Napoleão já ficou nas Tulherias, que o rei Luís XVIII acabava de desertar.

Três meses depois de entrar em Paris, o general deixava-se derrotar em Waterloo, outros três meses e chegava à Santa Helena das brumas, para ao fim de seis anos morrer de tédio. Valeu a pena o esforço de tentar outra vez? Sim, mas só por esse plebiscito popular de vinte dias, indo pelo país acima, carregando as baterias da ilusão de que a glória imperial se podia repetir.

Os vinte dias de estrada de Napoleão, da costa sul a Paris, são um caso de estudo que merece chegar a hoje. O regresso de Napoleão Bonaparte foi ilustrado em letra de imprensa, de forma que deslustra a imprensa, mas mostra o género humano em retrato nítido. O jornal parisiense Le Moniteur narra, passo a passo, o avanço de Napoleão. Os títulos sucessivos vou alinhá-los:

1) "O antropófago saiu do seu covil."

2) "O ogre da Córsega acaba de desembarcar no golfo Juan."

3) "O tigre chegou a Gap."

4) "O monstro dormiu em Grenoble."

5) "O tirano atravessou Lyon."

6) "O usurpador foi visto a sessenta léguas da capital."

7) "Bonaparte avança a passos largos, mas nunca entrará em Paris."

8) "Napoleão estará amanhã nas nossas portas."

9) "O Imperador chegou a Fontainebleau."

10) "Sua Majestade Imperial entrou ontem no Castelo das Tulherias, no meio dos seus súbditos fiéis."

Só por este monumento jornalístico valeu a pena o regresso da ilha de Elba.

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Poesia Matemática

Um Quociente apaixonou-se
Um dia

Doidamente

Por uma Incógnita.

 

Olhou-a com seu olhar inumerável

E viu-a, do Ápice à Base...

Uma Figura Ímpar;

Olhos rombóides, boca trapezóide,

Corpo ortogonal, seios esferóides.

 

Fez da sua

Uma vida

Paralela à dela.

Até que se encontraram

No Infinito.

 

"Quem és tu?" indagou ele

Com ânsia radical.

"Sou a soma do quadrado dos catetos.

Mas pode chamar-me Hipotenusa."

 

E de falarem descobriram que eram

O que, em aritmética, corresponde

A alma irmãs

Primos-entre-si.

 

E assim se amaram

Ao quadrado da velocidade da luz.

Numa sexta potenciação

Traçando

Ao sabor do momento

E da paixão

Rectas, curvas, círculos e linhas sinusoidais.

 

Escandalizaram os ortodoxos

das fórmulas euclidianas

E os exegetas do Universo Finito.

 

Romperam convenções newtonianas

e pitagóricas.

E, enfim, resolveram casar-se.

Constituir um lar.

Mais que um lar.

Uma Perpendicular.

 

Convidaram para padrinhos

O Poliedro e a Bissectriz.

E fizeram planos, equações e

diagramas para o futuro

Sonhando com uma felicidade

Integral

E diferencial.

 

E casaram-se e tiveram

uma secante e três cones

Muito engraçadinhos.

E foram felizes

Até àquele dia

Em que tudo, afinal,

se torna monotonia.

 

Foi então que surgiu

O Máximo Divisor Comum...

Frequentador de Círculos Concêntricos.

Viciosos.

 

Ofereceu-lhe, a ela,

Uma Grandeza Absoluta,

E reduziu-a a um Denominador Comum.

 

Ele, Quociente, percebeu

Que com ela não formava mais Um Todo.

Uma Unidade.

Era o Triângulo,

chamado amoroso.

E desse problema ela era a fracção

Mais ordinária.

 

Mas foi então que Einstein descobriu a Relatividade.

E tudo que era espúrio passou a ser

Moralidade

Como aliás, em qualquer

Sociedade.

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Os novos cortes do governo.



Como começou o funcionamento de Portugal ....

Nos tempos em que os reis mandavam, numa noite escura, à entrada de dezembro, o rei veio à varanda do seu iluminado palácio e reparou que a cidade estava escura como breu.

Chamou o seu primeiro-ministro e ordenou-lhe:

- Antes do natal quero ver a cidade toda iluminada. Toma lá 500 cruzados e trata já de resolver o problema.

O primeiro-ministro chamou o presidente da câmara e ordenou-lhe:

- O nosso rei quer a cidade toda iluminada ainda antes do natal. Toma lá 250 cruzados e trata imediatamente de resolver o problema.

O presidente da câmara chama o chefe da polícia e diz-lhe:

- O nosso rei ordenou que puséssemos a cidade toda iluminada para o natal. Toma lá 100 cruzados e trata imediatamente de resolver o problema.

O chefe da polícia emite um edital a dizer:

“Por ordem do rei em todas as ruas e em todas as casas deve imediatamente ser colocada iluminação de natal.  Quem não cumprir esta ordem será enforcado”.


Uns dias depois o rei veio à varanda e, ao ver a cidade profusamente iluminada, exclamou:
- Que lindo! Abençoado dinheiro que gastei. Valeu a pena.

 

… E foi assim que Portugal começou a funcionar …